NEXT: Uma experiência de sucesso com o método PBL no CIn-UFPE

Centro de Informática da UFPE
10 min readAug 6, 2019

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Em 11 anos, o NEXT se tornou uma das principais referências em inovação educacional na área de tecnologia

Quebrando paradigmas da tradicional metodologia utilizada em sala de aula, o método de ensino PBL (do inglês Problem Based Learning) tem conquistado espaço na pesquisa de educadores mundo afora. Sob a premissa de aprimorar e difundir abordagens diferenciadas de ensino, o grupo de pesquisa NEXT (iNnovative Educational eXperience in Technology) do Centro de Informática (CIn) da UFPE desenvolve, há 11 anos, estratégias para solucionar os desafios que envolvem especificamente o ensino da computação.

Para a pesquisadora do CIn e consultora-líder do grupo NEXT Simone Santos, o diferencial do PBL consiste em inverter o sentido do ensino tradicional, onde a condução do conteúdo é feita pela figura do professor. Primeiro acontecem as atividades práticas, em que os estudantes são “donos” dos problemas que precisam solucionar: “a partir da prática, ele (o estudante) vai buscar conteúdo para apoiar a resolução desses problemas e com esses problemas aprender”, comenta. No grupo NEXT, os alunos são divididos em pequenos grupos que, sob a supervisão de Simone e outros tutores, trabalham em cima de problemas e situações do mundo real, com a presença do cliente real dentro da sala de aula.

Em Pernambuco, a pesquisadora relata que a adoção do método veio com o intuito de fomentar a formação educacional na área de TI para atender também às demandas do mercado, já que estimula o espírito proativo e empreendedor dos estudantes. Em 2007, Simone era consultora na área educacional do CESAR (Centro de Estudos e Sistemas Avançados do Recife) quando recebeu a proposta de implementar o método PBL no primeiro Mestrado Profissional daquela instituição. A metodologia que, até então, era quase exclusivamente adotada nas universidades de medicina, surgiu como solução para a discrepância entre uma “projeção gigante de oferta de empregos e uma evasão gigante dos cursos de tecnologia”, conforme ressaltou. Havia, além disso, um “desalinhamento” dos cursos de graduação em relação às demandas do mercado, já que a maioria dos estudantes recém-formados em TI não estavam capacitados para atuar na área.

Dentro do CIn, a primeira disciplina aplicada com o PBL — gestão de projetos em Sistemas da Informação — foi ministrada por Simone em conjunto com alunos de mestrado e doutorado que se juntaram à docente profissionalizando o grupo de pesquisa NEXT. Desde então, a experiência gerou resultados tão positivos na formação dos alunos — e, consequentemente, na resolução de problemas do dia-a-dia — que passou a ser replicada em outros locais para além do Centro de Informática.

Segundo a consultora-líder do NEXT, grupo de pesquisa tem como premissa básica aprimorar e difundir as chamadas “abordagens d
Segundo a consultora-líder do NEXT, grupo de pesquisa tem como premissa básica aprimorar e difundir as chamadas “abordagens diferenciadas de ensino”

Ensino

No âmbito acadêmico, um dos disseminadores das pesquisas desenvolvidas pelo grupo é Felipe Soares, doutorando orientado por Simone e professor do Centro Universitário de João Pessoa (UNIPÊ). Para ele, pesquisar sobre a aplicação do PBL no ensino da computação, em confluência com o fato de atuar como professor na área, tem favorecido o seu desempenho profissional. “Dentro desse período (do doutorado) a gente desenvolveu uma ferramenta chamada PBL Maestro, que tem como objetivo sistematizar o fluxo processual da aplicação da metodologia xPBL e do processo de avaliação autêntica”, o que contribui, do ponto de vista do professor, para facilitar a aplicação do método. A ferramenta já foi utilizada diversas vezes em sala de aula, “inclusive durante toda uma disciplina de graduação do CIn, no curso de Sistemas da Informação, e também durante uma disciplina na pós-graduação”, destacou.

Os resultados dessas experiências, publicados em dois artigos científicos, demonstraram que a ferramenta “possibilita que o professor tenha condições de gerenciar o método de maneira eficiente, tanto do ponto de vista das etapas que constituem o planejamento da disciplina, quanto a parte de avaliação e feedback”, considerados fundamentais no ‘workflow’ do método. Para Felipe, o desenvolvimento da ferramenta foi bastante favorecido pela expertise do grupo de pesquisa que, desde 2007, “vem sendo uma referência nacional na aplicação do PBL e com certeza vai se tornar uma referência mundial”.

Outra propagadora das pesquisas do grupo em sala de aula é Ariane Rodrigues, professora na UPE de Garanhuns. Ela relata que conheceu a abordagem PBL ainda no mestrado, por intermédio da professora Simone, e que desde então busca “entender os desafios e tentar transformar o cenário educacional na área de Computação”. Como docente universitária, ela propõe em sua tese de doutorado um framework conceitual que além de integrar as pesquisas do NEXT tem como objetivo sistematizar a implementação dos processos de ensino e aprendizagem em PBL. O framework, batizado de By-Cycles, “foi concebido em ciclos evolutivos, com contribuições de pesquisas desenvolvidas pelo grupo”, ressalta. A ferramenta é estruturada em quatro etapas (Plan, Do, Check e Act) e possui componentes metodológicos que apoiam a operacionalização de atividades do processo.

De acordo com a doutoranda, “cada pesquisa realizada no grupo NEXT favoreceu a vivência de experiências em estudos de casos reais com resultados que comprovam a eficácia da aplicação de PBL, inclusive, sob as perspectivas dos estudantes”. É dessa forma que a sua pesquisa, bem como as demais do grupo, procura difundir convicções acerca do método para que mudanças no ensino superior em computação sejam implementadas. Nesse sentido, Ariane defende que compartilhar os resultados das pesquisas e experiências do NEXT é uma prática fundamental do grupo, pois “tem atraído cada vez mais docentes que desejam mudar e melhorar o processo de aprendizagem com PBL”.

Ferramenta criada por Felipe Soares facilita a aplicação do método PBL em sala de aula
Ferramenta criada por Felipe Soares facilita a aplicação do método PBL em sala de aula

Mercado

Atualmente, o grupo NEXT conta 5 alunos doutorandos em PBL, sendo um deles Gustavo Alexandre, professor e coordenador de pesquisa e extensão da CESAR School. Fazendo parte do Porto Digital, a escola de inovação do CESAR foi inaugurada neste ano e conta com dois cursos de graduação (Ciência da Computação e Design) baseados na metodologia PBL. De acordo com a professora Simone, desde o lançamento da CESAR School, Gustavo tem sido o principal integrador entre as duas instituições de ensino, já que a pesquisa desenvolvida durante o seu doutorado, no CIn-UFPE, tem sido aplicada no planejamento dos cursos da escola de inovação.

Assim como Felipe e Ariane, a pesquisa desenvolvida por Gustavo tinha como proposta criar um instrumento que auxiliasse os professores e coordenadores de graduação no sentido de como adotar o método respeitando os princípios originais da abordagem. Para ele, “a importância da pesquisa se dá nesse apoio dos professores para que façam a adoção da maneira mais próxima ao que a teoria PBL prerroga para que os resultados na execução sejam positivos”. Ele ressalta que, a partir do que tem se desenvolvido no NEXT, outras instituições de ensino locais já perceberam a necessidade de adoção de metodologias ativas como o PBL, cuja abordagem é “centrada no aluno para o desenvolvimento de competências que tanto empresas quanto as instituições de ensino prezam”.

Nesse sentido, o doutorando Bruno Bessa comenta que a existência de um novo mercado que integra educação a tecnologia já é, há alguns anos, uma tendência mundial. De acordo com Bruno, que além de professor do IFAL também é empreendedor na área de PBL, ao mesmo tempo em que professores e estudantes incorporam inovações tecnológicas em sala de aula, “a área de atuação batizada de EdTech nos Estados Unidos se concretiza no Brasil com o surgimento de startups dispostas a contribuir para a melhoria do ensino”.

Sob a orientação de Simone, a pesquisa do doutorando tinha como o intuito inicial identificar quais eram os principais problemas nos ambientes virtuais de educação. “Acabamos identificando alguns como a falta de adequação dos ambientes virtuais de aprendizagens a metodologias de ensino diferentes das tradicionais e a falta de engajamento dos participantes nos ambientes virtuais de aprendizagem tradicionais”, comenta. Levando em consideração esses empecilhos, eles resolveram desenvolver um modelo de ambiente virtual de aprendizagem imersivo, apoiado em objetivos pedagógicos, que utiliza “uma estratégia metodológica de ensino-aprendizagem baseada em problemas e um sistema de gameficação com a finalidade de promover motivação, interesse, e auto-aprendizagem dos participantes”.

Foi assim que, de olho no mercado, Bruno desenvolveu o ambiente virtual colaborativo denominado de Coach. O projeto, que foi aprovado em editais de inovação como o programa de apoio à pesquisa e desenvolvimento Tecnova AL, além de ter recebido o 1º lugar no Concurso Internacional Apps.edu realizado no Congresso Brasileiro de Informática na Educação — CBIE 2016, já tem sido aplicado em startups brasileiras da área de tecnologia. Para Bruno, “técnicas virtuais, interatividade, criatividade e espaço lúdico, são algumas características contidas nos ambientes virtuais de aprendizagem imersivos, que merecem uma grande reflexão dos pesquisadores e empreendedores da área de educação”. Refletindo sobre o papel NEXT e da própria pesquisa que desenvolveu no grupo, ele garante que, em um futuro próximo, “o modelo de carteiras enfileiradas, professores no centro do ensino aprendizagem e metodologias de ensino tradicionais” ficará para trás.

O ambiente virtual colaborativo criado por Bruno Bessa já recebeu prêmios e foi aprovado em editais de inovação como o Tecnov
O ambiente virtual colaborativo criado por Bruno Bessa já recebeu prêmios e foi aprovado em editais de inovação como o Tecnova AL

Cooperação

Além das parcerias que o grupo de pesquisa estabeleceu, direta ou indiretamente, com instituições de ensino públicas e privadas, o NEXT também conta com a colaboração de pesquisadores dentro do próprio ambiente da Universidade. Um deles é Marlos Ribeiro, mestrando em Ciência da Computação e também Coordenador de Projetos do NTI — Núcleo de Tecnologia da Informação da UFPE, órgão responsável pela gestão de infraestrutura de software e hardware da instituição. Coordenando a implantação de novos sistemas no campus e, ao mesmo tempo, integrando a linha de pesquisa do grupo que é voltada para negócios, Marlos é um dos clientes reais que traz, para o ambiente da sala de aula, problemas a serem solucionados pelos alunos.

Em relação à parceria, Marlos avalia que “o NTI tem sido um laboratório muito bom ao trazer problemas para dentro da sala de aula para que os alunos possam desenvolver capacidades e entendimentos e, a partir disso, desenvolver soluções para o NTI”, que tem a responsabilidade de pesquisar, desenvolver, executar e participar de projetos em TI e serviços de informática na UFPE. “Somente comigo já são 4 semestres que a gente está colaborando e passando por vários problemas, desde aqueles voltados para a arquitetura empresarial como também nas disciplinas de sistemas de gestão empresariais, que é onde os alunos devem vivenciar as problemáticas de implantação de RPS, sistemas que controlam uma organização como um todo”, comenta. Para ele, “isso tem sido enriquecedor de ambas as partes”, já que, ao mesmo tempo em que os estudantes têm a oportunidade de desenvolver competências a partir de situações práticas, o que confere a autenticidade do PBL, soluções inovadoras são desenvolvidas e aplicadas dentro da organização.

Futuro

Analisando o que foi desenvolvido pelo NEXT desde 2007, a pesquisadora Simone Santos aponta, entre os próximos planos, a formação dos doutorandos em PBL. Para ela, isso “representará que cada doutor pôde se aprofundar na abordagem, aplicá-la várias vezes, contribuindo e criando instrumentos para sua adoção”. Em um contexto geral em que outras instituições de ensino anseiam pela adoção de abordagens inovadoras, a formação de especialistas com vivência prática é um importante passo para promover uma educação de melhor qualidade, comenta Simone.

Outro passo importante para a disseminação das pesquisas realizadas pelo grupo será a criação de instrumentos, como aplicativos, livros e um site integrador dos produtos e ferramentas do NEXT, que irão facilitar o processo de replicação do modelo em outros locais. Em relação a aplicativos, Simone comenta que já está sendo desenvolvido um app mobile que auxilia no preenchimento da ferramenta desenvolvida durante o doutorado de Gustavo Alexandre, o “PBL Planner ToolKit”. A ideia é também “escrever um livro que ajude a utilizar o ToolKit, que na verdade é um canvas feito para auxiliar a equipe pedagógica no planejamento da abordagem PBL e que acompanha cartas instrucionais de ensino”, expõe a docente.

Com o objetivo de ampliar a divulgação desses conhecimentos, há também a proposta de lançar um livro que contenha os experimentos e casos reais vivenciados pelo grupo. De acordo com a pesquisadora, o intuito é fazer uma “coletânea de experiências”, já que “nosso grupo tem mais de 10 anos, então nós trabalhamos tanto em mestrados profissionais, começando pelo mestrado profissional do CESAR, mas também em residências de software, disciplina acadêmicas e cursos de extensão”. Ela ressalta que muitos deles já foram publicados em artigos científicos e agora “a ideia seria fazer isso com a participação pelo menos dos 4 doutores do NEXT que estão se formando”.

Para ir além do ambiente acadêmico, e, assim, estabelecer uma conexão ainda maior do grupo em relação ao mercado, Simone também enxerga como possibilidade a formação de uma startup em consultoria educacional. “Como nós temos vários instrumentos e queremos criar ambientes para disseminar a abordagem, a gente viu que isso não vai ganhar a devida relevância e abrangência se a gente não tiver uma equipe focada em disseminar a abordagem”. Nesse sentido, ela explica que o objetivo é firmar novas parcerias e “nos unirmos e organizarmos em um grupo para prestar consultoria em PBL para várias instituições”, o que tornaria necessária a organização de uma “empresa” de consultores especializados na metodologia. Assim, ela identifica uma necessidade cada vez maior em formar “capital humano” adequado para ampliar as atividades desenvolvidas pelo NEXT e, dessa forma, a atmosfera de impacto do grupo, o que aponta para o surgimento de uma pós-graduação profissional em PBL no futuro.

Por Júlia Lyra

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